• 16-09-2024

A falta de repertório emocional

Certa vez assisti uma entrevista do @emicida no #PapodeSegunda no @gnt  em que ele narra um dia que a terapeuta de suas filhas disse: “Leandro, talvez te falte repertório emocional” e como isso explodiu na mente dele. Sendo sincero, isso também ressoou bem forte na minha cabeça.   

Na esteira da sobrevivência contra o racismo, “emoções” nunca foi uma ferramenta amplamente estimulada. Nossos familiares reforçavam preocupações como conquistas sociais (“você precisa ser alguém na vida”), sobrevivência (“esteja sempre com um documento no bolso, quando for parado pela polícia) e até mesmo com a integridade física (“se apanhar na rua, apanha mais em casa”, sendo essa frase um reforço quase inconsciente de que o homem negro precisa ser hostil para continuar vivo).   

No entanto, os tempos atuais exigem outras abordagens e uma delas está ligada aos sentimentos. É bem comum eu me deparar ou alguém me mandar um post com o tema: “homens negros precisam falar mais”. Sempre me pergunto: falar sobre o quê? Seria esse “falar mais” uma sentença, um convite ou uma obrigação para atender essa ou aquela expectativa? Qual vai ser o cenário que vou encontrar ao falar das minhas emoções, acolhimento ou cancelamento? Quem estará disposto a ter uma escuta ativa?   

“Ok, talvez eu tenha que conversar com os meus semelhantes”, penso. A maioria deles não sabem nem por onde começar a construir um repertório emocional, e o que já estão mais avançados não desejam diálogos (em sua maioria preferem debater com outras pessoas). Parece um caminho solitário, justamente para uma pauta que é coletiva. Porém, mais um dia eu estou aqui, com os que não tem bagagem emocional, tentando criar pontes. Ainda que essas ligações pareçam pequenas para a urgência de quem me exige “falar mais” sobre coisas que ainda não sei como dizer.   

Sim, talvez nos falte repertório emocional ou uma visão mais “clara” de como falar dos nossos sentimentos. É que até outro dia a escravidão tinha tomado a minha “humanidade”. Ainda sou novo no campo do sentir, do expressar e do aprendizado das minhas emoções. Me desculpe por isso.   

 

Will Marinho

Jornalista, redator publicitário e escritor. Mineiro de 31 anos, o profissional coleciona passagens por veículos como CNN e Casa Vogue, bem como campanhas assinadas para marcas como Chivas Reagal, Samsung, Sallve, Pepsi e Will Bank.