22 de outubro de 2025

África

A língua Hadza: o idioma feito de estalos que sobrevive há milênios na Tanzânia

Considerado um isolado linguístico, o Hadza guarda vestígios das formas mais antigas de fala humana.

• 14/10/2025
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Reprodução: Shutterstock | @/hadzabelifestyle

No coração da Tanzânia, às margens do Lago Eyasi, vive um dos últimos povos caçadores-coletores da África: os Hadzabe (ou Hadza, como se autodenominam). Enquanto o mundo corre para o futuro, eles mantêm viva uma língua que parece vir de um passado remoto uma língua onde as palavras são feitas de estalos, silêncios e respiros.

A língua Hadza é um isolado linguístico, ou seja, não pertence a nenhuma família conhecida. Falada por cerca de mil pessoas, ela carrega sons que poucos fora da comunidade conseguem reproduzir: os chamados “clicks”, estalos produzidos com a língua e as bochechas, usados como consoantes com valor fonético próprio. Não é um sotaque, nem uma curiosidade sonora são palavras inteiras formadas a partir de vibrações que parecem música.

Esses “clicks” têm diferentes tipos: dentais, laterais e palatais, dependendo do ponto de articulação dentro da boca. Cada clique muda o significado de uma palavra, funcionando como letras vivas de um alfabeto ancestral. Em gravações feitas por linguistas da Universidade da Califórnia (UCLA), é possível ouvir como o idioma flui em uma cadência que mais lembra uma canção uma alternância entre som, ritmo e pausa que se repete há milhares de anos.

Mas a importância do Hadza vai além da fonética. A língua é uma ponte entre passado e presente, preservando a visão de mundo de um povo que vive em harmonia com a natureza e rejeita a agricultura e o consumo industrial. Para os Hadzabe, falar sua língua é também manter vivo o modo de existir dos primeiros humanos uma conexão direta com os sons que moldaram a comunicação antes mesmo da escrita.

Segundo pesquisadores do Max Planck Institute for Evolutionary Anthropology, os idiomas de clique podem ser os parentes mais próximos das línguas originais da humanidade. Estudos de DNA indicam que os Hadzabe têm uma linhagem genética muito antiga, separada de outros grupos africanos há dezenas de milhares de anos o que torna sua língua uma espécie de registro vivo da história da fala humana.

Hoje, menos de mil pessoas dominam o Hadza fluentemente. Ainda que a língua continue sendo transmitida entre pais e filhos, o contato crescente com o turismo e o avanço do suaíli colocam em risco sua continuidade. A UNESCO classifica o idioma como “vulnerável”, e há iniciativas locais e internacionais para documentar suas histórias, canções e vocabulário.

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