26 de dezembro de 2024

Entrevistas

Entenda o impacto da redução da diversidade nas publicidades de marcas para redes sociais no Brasil

Africanize conversou com influenciadores, publicitários e empresários impactados pela redução de representatividade negra na comunicação de marcas para o Dia da Consciência Negra

Danilo Castro• 25/11/2024
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De acordo com o estudo “ Diversidade na comunicação de marcas nas redes sociais ”, publicado pela Buzzmonitor, SAR65 e Elife em julho deste ano, a presença de pessoas negras em campanhas publicitárias caiu de 52,7% em 2022  para 31,6% em 2023, uma  queda de 21,1% em um período de 12 meses.  

Na prática, influenciadores digitais, agências de publicidade e empreendedores vêm sendo impactados pelo mercado publicitário ao longo dos últimos dois anos, com a diminuição de oferta de trabalhos.  Afrolai, Artur Santoro (Batekoo) , Bell Rocha, Diogo Teixeira, Eddy Silva, Leticia Sotero  (Agência Asminas) , Mauricio Sacramento  (Batekoo) Núria Juelma, Ricardo Silvestre  (Agência Black Influence) e Stace Hills conversaram com a Africanize, onde compartilharam experiências pessoais e perspectivas sobre racismo estrutural dentro do mercado da comunicação.  

Stace Hills  

No Rio de Janeiro, Stace Hills viu o seu trabalho como criadora de conteúdo dar frutos ainda em 2023, quando começou a fazer publicidade na internet. Com 664 mil seguidores no TikTok 387 mil seguidores no Instagram , a influenciadora conta que a vida dela progrediu com seu trabalho na internet; entretanto, ainda se depara com desafios financeiros. “Eu ainda sou negra e vou continuar sendo. Eu morava na casa dos meus pais, agora eu moro de aluguel, dá para comprar as minhas coisas e eu estou satisfeita com o que eu tenho, mas claro que poderia ser um pouco melhor.” , diz Stace Hills.  

Em agosto deste ano, Stace Hills anunciou nas redes sociais que havia iniciado em um emprego de carteira assinada em uma loja de produtos para cabelo. Segundo a influenciadora, a decisão partiu de um reflexo do comportamento do mercado publicitário, onde as ofertas de publicidade surgem principalmente de plataformas de jogos de azar.  “Eu tenho problemas financeiros, mas eu recorri ao trabalho porque não gostaria de fazer ‘tigrinho’. A plataforma paga bem, mas eu disse: ‘Não, eu posso estar destruindo uma família com um único story, eu jamais vou fazer isso” , explica.  

Enquanto isso, quando se fala de publicidade para marcas, as propostas chegam em uma quantidade menor, explica Stace. “As marcas falam muito de uma diversidade que no papel é diferente. Sou muito grata pelas que chegam até mim, ou que a minha agência vai atrás, mas se você pega uma pessoa um pouco mais clarinha do que eu, e às vezes ela tem até um número menor e um engajamento menor, ela vai estar fazendo mais publicidade.” .  

A influenciadora destaca ainda as exigências do mercado publicitário às pessoas negras. “ Querem apenas com um número maior de seguidores. E precisa ter todo um filtro por dentro, porque você pode ser negro, mas tem que ter um traço específico, precisa ser o negro que eles querem. São produtos consumidos por pessoas negras, com pessoas negras, na perspectiva branca de sempre .”  

Para a campanha do novembro negro deste ano, período que recorda e evidencia a luta e resistência da população negra contra o racismo, Stace Hills conta que não recebeu muitas propostas para este mês.  “Já não tem mais. De cinquenta negros, eles só querem trabalhar com os mesmos dois. Não estão mais preocupados em conscientizar, só vender. O movimento Black Lives Matter só importa até certo ponto.”  

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 Stace Hills. (Foto: Reprodução/Instagram)

Afrolai  

Do Rio de Janeiro, mas nascida em Campos dos Goytacazes, Afrolai é DJ e influenciadora digital. Trabalhando desde os 11 anos, a campista já passou por diferentes profissões até se tornar artista: de manicure às lojas de departamento. Mas foi na música que ela se encontrou, e mesmo com seus 70,5 mil seguidores no Instagram , são nas festas e eventos que ela engaja o seu público.  

Apenas no Soundcloud, o DJ Set de Afrolai “ Sexo Só Depois do Baseado ” possui 149 mil reproduções. E foi com a arte e a internet que Afrolai conseguiu mudar de vida. “ Eu não tinha uma base, não tinha nada, mas sabia dentro de mim que eu ia alcançar muitas coisas. E quando me vejo nesse lugar hoje, tendo o meu filho, a minha casa, eu acho que vivo um sonho. Só vim com um colchão, algumas roupas, um fogãozinho duas bocas e um sonho .”  

Até 2024, ela já se apresentou em diferentes regiões do país e produz a festa “Baile da Afrolai” no Rio de Janeiro. Mas quando se trata de parcerias comerciais na internet, Afrolai considera o mercado ainda injusto para pessoas negras. Mãe de primeira viagem, a DJ confessa que esperava receber propostas de trabalho para o dia das mães deste ano. “ Eu tenho deixado bem claro o meu lado maternal e nada, é bem frustrante. ”. Para ela, as exigências do mercado dificultam mais ainda o processo de conseguir trabalhos comerciais. “ Você não pode ser simplesmente uma pessoa negra existindo, tem que ser a pessoa negra com cabelo liso, ou ativista, saia jeans e camisa branca. Aí vem uma pessoa não negra e se enquadra de qualquer forma [para a publicidade].”  

“E eu não falo só de mim, mas falo até de amigos meus que trabalham com arte ou internet, mas ainda estão no CLT porque não conseguem uma oportunidade. A internet promete te fazer crescer, só que a gente ainda é muito invisível para as empresas, são ambientes totalmente embranquecidos.”  

E para o mês do novembro negro, a quantidade de ofertas para publicidade e campanhas é quase nula. “ Não está tendo mais isso e está ficando cada vez mais claro essa regressão. E para nós que trabalhamos com internet, é preciso fazer muita entrega, ter literalmente uma rotina excessiva para sermos vistos por essas marcas”  

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Foto: Lu/Now Moss

Eddy Silva  

De São Paulo, Eddy Silva sempre viu as redes sociais como um espaço seguro para compartilhar suas perspectivas sobre cultura. A jornada do influenciador na internet começou em 2015 no Facebook, mas foi no TikTok que ele encontrou um meio de ser amplamente reconhecido pelos seus conteúdos.  Com 271 mil seguidores na rede social , além dos 37,3 mil seguidores no Instagram , Eddy Silva produz vídeos de reação sobre cabelos e assuntos em alta na internet.  

“Fui percebendo que aquilo era interessante para mim, que eu gostava. Apesar de eu ser muito tímido pessoalmente, na internet eu sempre fui um pouco mais despido, então acho que isso me ajudou nessa relação. Hoje em dia, as pessoas mandam as suas publicações para mim, me marcam em publicações só para ouvir a minha opinião sobre aquilo, é uma parada bem louca, ainda não me acostumei com isso.”  

Quando o assunto é publicidade, Eddy Silva acredita que as marcas não possuem muito interesse em trabalhar com influenciadores que abordam assuntos considerados polêmicos na internet.  “O meu nicho, eu descobri da pior forma que é bem difícil para publicidade, porque se tratam de conteúdos delicados, e nem toda marca quer apoiar isso. Meu conteúdo é sobre opinião e as marcas na maioria das vezes tem medo, e quando não possuem medo, não querem investir.” , explica o influenciador.  

Para driblar as dificuldades no mercado de influência, Eddy Silva conta que criou uma conta alternativa para tratar assuntos mais ‘leves’ da internet.  “É um pouco difícil para mim porque eu estou acostumado, e meus seguidores também, a me verem reagindo de uma difrente forma. Eles querem saber a minha opinião sobre os assuntos. Abri essa outra conta para chamar atenção de marcas, mas não consegui seguir adiante.”  

Para o mês de novembro, o influenciador também diz que não surgiram marcas oferecendo propostas de publicidade. “Até agora nada. Eles parecem que têm a ideia [de fazer o convite] um dia antes e depois mandar para você, que não é planejada. E olha que novembro é um mês onde uma pessoa preta passa ‘bem’, né?’” , conta.  

 

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Foto: Arquivo Pessoal

Ricardo Silvestre – Agência Black Influence  

Também em São Paulo, a Black Influence ( @blackinfluence ) é uma das agências de comunicação que se consolidou no mercado de influência nos últimos cinco anos. Fundada por Ricardo Silvestre ( @ricardosilvestre ), a empresa surgiu a partir de uma necessidade do publicitário de gerir o próprio negócio.  “Foi uma necessidade pessoal e profissional que eu tinha, porque o adoeci trabalhando no mercado de agências, e eu não tinha muita opção. Ou eu desistia da carreira ou eu me reinventava, que naturalmente é mais difícil pra gente”.  

Com um casting fixo diverso e majetoriamente negro, a empresa celebra o repasse de R$40 milhões para influenciadores negros ao longo dos cinco anos de agência. Segundo Silvestre, o valor reforça a importância de estabelecer conexão entre marcas e influenciadores pouco reconhecidos no mercado.   

“Eu tenho troca  com os influenciadores no dia a dia e vejo uma galera que saiu da favela e conseguiu comprar uma casa própria, que tem tido uma independência financeira e que consegue ajudar os pais. Acho isso muito importante, principalmente sabendo do lado de cá, onde eu sei como as coisas funcionam e como o mercado é extremamente injusto em diversos aspectos.”  

Ricardo Silvestre acredita que o mercado ainda é resistente em gerir diferentes temáticas durante um mesmo período. “ O mercado tem uma série de dificuldades, e uma delas é trabalhar diversas pautas ao mesmo tempo” , destaca. Segundo ele, as empresas costumam escolher apenas um ou dois temas para abordar ao longo do ano, como ‘ Pride ’ ou Consciência Negra. Para o publicitário, convencer as marcas de que é possível abordar temas de forma contínua e orgânica ao longo do calendário anual é um dos grandes desafios do setor.  

“Tem marcas também que preferem não trabalhar com pauta nenhuma, e isso acaba sendo uma tendência. Eu já ouvi coisas terríveis e de marcas que falam: ‘Eu não trabalhei com a comunidade negra o ano todo, também não vou trabalhar em novembro.’ Como se elas tivessem fazendo uma grande coisa e fossem ótimas e mega responsáveis. E se por acaso essa comunidade deixar de consumir um produto ou serviço? É o fim da marca no Brasil.”, afirma.  

Silvestre aponta a necessidade de ter mais investimentos para que o setor publicitário realmente promova mudanças significativas e alinhadas com a realidade brasileira.  “A gente já provou de uma vez por todas que a gente sabe o que a gente está fazendo, que o nosso trabalho é eficiente e que faz sentido, mas que sem grana ninguém vai fazer nada. Não adianta as marcas fingirem que não estão vendo isso e preferirem comprar qualquer outra pauta ou patrocinar qualquer outro festival que não tenha propósito e que não converse de fato com o Brasil. O mercado publicitário por muitos anos viveu distante do Brasil real”.  

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Ricardo Silvestre, CEO da agência Black Influence. (Foto: Jordan Vilas)

Núria Juelma  

De Belém, no Pará, mas nascida em Angola, Núria Juelma se mudou para o Brasil ainda criança. Em contato com a moda desde a infância por conta do salão de beleza que sua mãe administra, a jovem ainda cedo passou a trabalhar no segmento e hoje comparti

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